quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

A Morte de Sócrates

"Vós também, senhores juízes, deveis bem esperar da morte e considerar particularmente esta verdade: não há, para o homem bom, mal algum, quer na vida, quer na morte, e os deuses não descuidam do seu destino. O meu não é consequência do acaso; vejo claramente que era melhor para mim morrer agora e ficar livre de fadigas. Por isso é que a advertência nada me impediu. Não me insurjo absolutamente contra os que votaram contra mim ou me acusaram. Verdade é que não me acusaram e condenaram com esse modo de pensar, mas na suposição de que me causava dano: nisso merecem censura. No entanto, só tenho um pedido a lhes fazer: quando meus filhos crescerem, castigai-os, atormentai-os com os mesmíssimos tomentos que eu vos infligi, se achardes que eles estejam cuidando mais da riqueza ou de outra coisa que da virtude; se estiverem supondo ter um valor que não tenham, repreendei-os, como voz fiz eu, por não cuidarem do que devem e por supor méritos sem ter nenhum. Se vós assim agirdes, eu terei recebido de vós justiça; eu, e meus filhos também. Bem, é chegada a hora de partimos, eu para a morte, vós para a vida. Quem segue melhor destino, se eu, se vós, é mistério para todos exceto para a divindade." 
(Apologia de Sócrates)


Artista: Jacques-Louis David

Assim Falou Zaratustra...

"Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar para atravessar o rio da vida. Ninguém, exceto tu, só tu. Existem, por certo, atalhos sem número, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio, mas isso te custaria a tua própria pessoa: tu te hipotecarias e te perderias. Existe no mundo um único caminho por onde só tu podes passar. Aonde leva? Não perguntes, siga-o!"

Friedrich Nietzsche (1844-1900)


terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Ninguém nasce mulher: torna-se mulher



"O gênero é o sexo socialmente. As relações de gênero, as relações entre homem-varões e mulheres são socialmente constituídas, e não determinadas biologicamente. [...] hoje é uma relação de desigualdade social e pessoal baseada na diferença entre os sexos e legitimidade em nome de um determinismo biológico de superioridade de um dos sexos e de uma determinada forma de viver a sexualidade, heterossexual." 


O Mito da Caverna - Platão

Quantas vezes julgamos as coisas apenas pela imagem que vemos nelas? Muitas vezes nós nos deixamos levar pelas aparências e não procuramos saber qual é o real significado das coisas.O Mito da Caverna narrado por Platão no livro VII do Republica é, talvez, uma das mais poderosas metáforas imaginadas pela filosofia, em qualquer tempo, para descrever a situação geral em que se encontra a humanidade. Para o filósofo, todos nós estamos condenados a ver sombras a nossa frente e tomá-las como verdadeiras. Essa poderosa crítica à condição dos homens, escrita há quase 2500 anos atrás, inspirou e ainda inspira inúmeras reflexões pelos tempos a fora.

O Mito da Caverna

"SÓCRATES – Figura-te agora o estado da natureza humana, em relação à ciência e à ignorância, sob a forma alegórica que passo a fazer. Imagina os homens encerrados em morada subterrânea e cavernosa que dá entrada livre à luz em toda extensão. Aí, desde a infância, têm os homens o pescoço e as pernas presos de modo que permanecem imóveis e só vêem os objetos que lhes estão diante. Presos pelas cadeias, não podem voltar o rosto. Atrás deles, a certa distância e altura, um fogo cuja luz os alumia; entre o fogo e os cativos imagina um caminho escarpado, ao longo do qual um pequeno muro parecido com os tabiques que os pelotiqueiros põem entre si e os espectadores para ocultar-lhes as molas dos bonecos maravilhosos que lhes exibem.
GLAUCO - Imagino tudo isso.
SÓCRATES - Supõe ainda homens que passam ao longo deste muro, com figuras e objetos que se elevam acima dele, figuras de homens e animais de toda a espécie, talhados em pedra ou madeira. Entre os que carregam tais objetos, uns se entretêm em conversa, outros guardam em silêncio.
GLAUCO - Similar quadro e não menos singulares cativos!
SÓCRATES - Pois são nossa imagem perfeita. Mas, dize-me: assim colocados, poderão ver de si mesmos e de seus companheiros algo mais que as sombras projetadas, à claridade do fogo, na parede que lhes fica fronteira?
GLAUCO - Não, uma vez que são forçados a ter imóveis a cabeça durante toda a vida.
SÓCRATES - E dos objetos que lhes ficam por detrás, poderão ver outra coisa que não as sombras?
GLAUCO - Não.
SÓCRATES - Ora, supondo-se que pudessem conversar, não te parece que, ao falar das sombras que vêem, lhes dariam os nomes que elas representam?
GLAUCO - Sem dúvida.
SÓRATES - E, se, no fundo da caverna, um eco lhes repetisse as palavras dos que passam, não julgariam certo que os sons fossem articulados pelas sombras dos objetos?
GLAUCO - Claro que sim.
SÓCRATES - Em suma, não creriam que houvesse nada de real e verdadeiro fora das figuras que desfilaram.
GLAUCO - Necessariamente.
SÓCRATES - Vejamos agora o que aconteceria, se se livrassem a um tempo das cadeias e do erro em que laboravam. Imaginemos um destes cativos desatado, obrigado a levantar-se de repente, a volver a cabeça, a andar, a olhar firmemente para a luz. Não poderia fazer tudo isso sem grande pena; a luz, sobre ser-lhe dolorosa, o deslumbraria, impedindo-lhe de discernir os objetos cuja sombra antes via. Que te parece agora que ele responderia a quem lhe dissesse que até então só havia visto fantasmas, porém que agora, mais perto da realidade e voltado para objetos mais reais, via com mais perfeição? Supõe agora que, apontando-lhe alguém as figuras que lhe desfilavam ante os olhos, o obrigasse a dizer o que eram. Não te parece que, na sua grande confusão, se persuadiria de que o que antes via era mais real e verdadeiro que os objetos ora contemplados?
GLAUCO - Sem dúvida nenhuma.
SÓCRATES - Obrigado a fitar o fogo, não desviaria os olhos doloridos para as sombras que poderia ver sem dor? Não as consideraria realmente mais visíveis que os objetos ora mostrados?
GLAUCO - Certamente.
SÓCRATES - Se o tirassem depois dali, fazendo-o subir pelo caminho áspero e escarpado, para só o liberar quando estivesse lá fora, à plena luz do sol, não é de crer que daria gritos lamentosos e brados de cólera? Chegando à luz do dia, olhos deslumbrados pelo esplendor ambiente, ser-lhe ia possível discernir os objetos que o comum dos homens tem por serem reais?
GLAUCO - A princípio nada veria.
SÓCRATES - Precisaria de algum tempo para se afazer à claridade da região superior. Primeiramente, só discerniria bem as sombras, depois, as imagens dos homens e outros seres refletidos nas águas; finalmente erguendo os olhos para a lua e as estrelas, contemplaria mais facilmente os astros da noite que o pleno resplendor do dia.
GLAUCO - Não há dúvida.
SÓCRATES - Mas, ao cabo de tudo, estaria, decerto, em estado de ver o próprio sol, primeiro refletido na água e nos outros objetos, depois visto em si mesmo e no seu próprio lugar, tal qual é.
GLAUCO - Fora de dúvida.
SÓCRATES - Refletindo depois sobre a natureza deste astro, compreenderia que é o que produz as estações e o ano, o que tudo governa no mundo visível e, de certo modo, a causa de tudo o que ele e seus companheiros viam na caverna.
GLAUCO - É claro que gradualmente chegaria a todas essas conclusões.
SÓCRATES - Recordando-se então de sua primeira morada, de seus companheiros de escravidão e da idéia que lá se tinha da sabedoria, não se daria os parabéns pela mudança sofrida, lamentando ao mesmo tempo a sorte dos que lá ficaram?
GLAUCO - Evidentemente.
SÓCRATES - Se na caverna houvesse elogios, honras e recompensas para quem melhor e mais prontamente distinguisse a sombra dos objetos, que se recordasse com mais precisão dos que precediam, seguiam ou marchavam juntos, sendo, por isso mesmo, o mais hábil em lhes predizer a aparição, cuidas que o homem de que falamos tivesse inveja dos que no cativeiro eram os mais poderosos e honrados? Não preferiria mil vezes, como o herói de Homero, levar a vida de um pobre lavrador e sofrer tudo no mundo a voltar às primeiras ilusões e viver a vida que antes vivia?
GLAUCO - Não há dúvida de que suportaria toda a espécie de sofrimentos de preferência a viver da maneira antiga.
SÓCRATES - Atenção ainda para este ponto. Supõe que nosso homem volte ainda para a caverna e vá assentar-se em seu primitivo lugar. Nesta passagem súbita da pura luz à obscuridade, não lhe ficariam os olhos como submersos em trevas?
GLAUCO - Certamente.
SÓCRATES - Se, enquanto tivesse a vista confusa -- porque bastante tempo se passaria antes que os olhos se afizessem de novo à obscuridade -- tivesse ele de dar opinião sobre as sombras e a este respeito entrasse em discussão com os companheiros ainda presos em cadeias, não é certo que os faria rir? Não lhe diriam que, por ter subido à região superior, cegara, que não valera a pena o esforço, e que assim, se alguém quisesse fazer com eles o mesmo e dar-lhes a liberdade, mereceria ser agarrado e morto?
GLAUCO - Por certo que o fariam.
SÓCRATES - Pois agora, meu caro Glauco, é só aplicar com toda a exatidão esta imagem da caverna a tudo o que antes havíamos dito. O antro subterrâneo é o mundo visível. O fogo que o ilumina é a luz do sol. O cativo que sobe à região superior e a contempla é a alma que se eleva ao mundo inteligível. Ou, antes, já que o queres saber, é este, pelo menos, o meu modo de pensar, que só Deus sabe se é verdadeiro. Quanto à mim, a coisa é como passo a dizer-te. Nos extremos limites do mundo inteligível está a idéia do bem, a qual só com muito esforço se pode conhecer, mas que, conhecida, se impõe à razão como causa universal de tudo o que é belo e bom, criadora da luz e do sol no mundo visível, autora da inteligência e da verdade no mundo invisível, e sobre a qual, por isso mesmo, cumpre ter os olhos fixos para agir com sabedoria nos negócios particulares e públicos."



A morte é o destino inexorável...

A morte é o destino inexorável de todos os seres vivos. Entretanto, só o ser humano tem consciência da própria morte. O homem se pergunta sobre a morte e o que pode ocorrer após o fim do mundo que conhecemos. A morte se representa assim não só como o fim da vida, mas também como limiar de outra realidade. A crença na imortalidade, na vida após a morte, simboliza o medo humano do fim e da destruição e seu anseio à eternidade. Se encararmos a morte como um dilaceramento interno, a morte está presente em tudo aquilo que fazemos, pois a morte é uma perda. Ao tomar alguma escolha convivemos com a perda daquilo que não escolhemos. Até mesmo no amor, como o grande poeta já dizia "...a morte, angustia de quem vive [...] fim de quem ama". A todo momento nos confrontamos com perdas, e precisamos aprender a abandonar o conforto do habito para nos lançarmos as novas possibilidades. Ao se dar conta da morte, o homem é capaz de transformar sua vida e tornar seu viver autêntico, enfrentando a angústia e assumindo a construção de sua própria vida.

"O homem não passa de um caniço, o mais fraco da natureza, mas é um caniço pensante. Não é preciso que o universo inteiro se arme para esmagá-lo: um vapor, uma gota de água, bastam para matá-lo. Mas, mesmo que o universo o esmagasse, o homem seria ainda mais nobre do que quem o mata, porque sabe que morre e a vantagem que o universo tem sobre ele; o universo desconhece tudo isso. [...] Toda a nossa dignidade consiste, pois, no pensamento. Daí que é preciso nos elevarmos, e não do espaço e da duração, que não poderiamos preencher. Trabalhemos, pois, para bem pensar; eis o princípio da moral" (PASCAL)

"...ninguém morre antes da hora. O tempo que perdeis não vos pertence mais do que o que precedeu vosso nascimento, e não vos interessa: 'Considerai em verdade que os séculos inumeráveis, já passados, são para vós como se não tivessem sido' [Lucrécio]. Qualquer que seja a duração de vossa vida, ela é completa. Sua utilidade não reside na duração e sim no emprego que lhe dais. Há quem viveu muito e não viveu. Meditai sobre isso enquanto o podeis fazer, pois depende de vós, e não do número de anos, terdes vivido bastante. Imagináveis então nunca chegardes ao ponto para o qual vos dirigíeis? Haverá caminho que não tenha fim?" (MONTAIGNE)

Morte e Vida (Klimt)


A liberdade e Sartre

Para Sartre, como para outros existencialistas, existir é para o homem fixar alvos, persegui-los, projetar-se a si próprio em direção ao futuro. É ultrapassando os obstáculos que impedem a consecução destes objetivos, que o homem é livre. É através do transcender dos obstáculos que o filósofo chama o homem de “ser-para-si”, com base no nada (vazio) de sua existência, é livre a cada momento – já que Sartre nega o efeito de condicionamentos passados sobre a consciência. Desta forma Sartre afirma que “o homem é condicionado a ser livre”; por sua própria condição de ser. Mas a liberdade só se forma através do confronto, do embate; daquilo que Sartre chama de “situação”, obstáculo. Por isso o filósofo afirma que “só existe liberdade em situação e só há situação por meio da liberdade”. Daí a questão da responsabilidade tão importante para o existencialismo, principalmente em Sartre. Para o existencialismo, o homem é mais livre quando se vê obrigado a escolher. A liberdade, além de ser inerente ao homem é valiosa, porque através dela o homem pode exercer sua dignidade e direito de escolha, à qual é condenado pela vida. E a liberdade escolhida implica assumir responsabilidades, assumir riscos. Em Existencialismo é um humanismo, Sartre nos diz que “o homem não é nada mais do que ele objetiva, ele só existe enquanto se realiza, ele é por isso, nada mais do que a soma de suas ações, nada mais do que a sua vida”. O argumento de Sartre é de que a completa liberdade de que gozamos – ou melhor, à qual estamos condenados – faz com que sejamos totalmente responsáveis por tudo aquilo que pensamos e fazemos. Escreve Sartre em Ser e Nada: “Sou o responsável por tudo, de fato, por minha responsabilidade mesmo, pois não sou o fundamento de meu ser. Portanto, tudo se passa como se eu estivesse coagido a ser responsável”.

“Porém, se realmente a existência precede a essência, o homem é responsável pelo que é. Desse modo, o primeiro passo do existencialismo é o de pôr todo homem na posse do que ele é, de submetêlo à responsabilidade total de sua existência. Assim, quando dizemos que o homem é responsável por si mesmo, não queremos dizer que o homem é apenas responsável pela sua estrita individualidade, mas que ele é responsável por todos os homens.” (SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanismo. São Paulo: Nova Cultural, 1987, p. 6. Os Pensadores).

O homem, ao delinear seu projeto, o faz na convicção de que o que é bom para si é bom para todos; a imagem do homem que desejamos ser é, ao mesmo tempo, a imagem do homem como julgamos que deve ser, de modo que nossa responsabilidade envolve toda a humanidade. (Marcella Martins)


Aprendendo a Duvidar...

""Não menos que se sabe, duvidar me apraz", afirma Dante. [...] A verdade e a razão são comuns a todos e não pertencem mais a quem as diz primeiro do que ao que as diz depois. Não é mais segundo Platão, do que segundo eu mesmo, que tal coisa se enuncia, desde que a compreendamos. [...] O proveito de nosso estudo está em nos tornamos melhores e mais avisados. É a inteligência que vê e ouve; é a inteligência que tudo se aproveita, tudo dispõe, age, domina e reina. Tudo o mais é cego, surdo e sem alma. Certamente nos tornaremos a criança servil e tímida se não lhe dermos a oportunidade de fazer algo por si. [...] saber de cór não é saber: é conservar o que se entregou a memória para guardar. Do que sabemos efetivamente, dispomos sem olhar para o modelo, sem voltar os olhos para o livro. Triste ciência a ciência puramente livresca. Platão afirma que a firmeza, a boa-fé, a sinceridade são a verdadeira filosofia. [...]
posto que a filosofia é a ciência que nos ensina a viver e que a infância como as outras idades dela podem tirar proveito, por que motivo não lha comunicaremos? [...] Buscai nela, jovens e velhos, um objetivo para vosso espírito; um alimento (sentido e esperança) [...] quem procede de outro modo parece dizer que ainda não é tempo de viver feliz, ou que já não o é."
MONTAIGNE, Ensaios. São Paulo: Nova Cultural. p. 75 - 77.

Pode-se dizer que filosofar é o nosso ato de tentar aprender a viver. O filósofo ama e procura constantemente o saber, não um saber abstrato, mas de compreensão e reflexão da realidade que nos cerca. Portanto, busca-se uma vivência esclarecida que implica em uma relação direta com o saber viver. Por isso, a filosofia não defende que haja uma verdade absoluta. Objetiva-se despertar a consciência para a cuidadosa reflexão sobre a existência, na tentativa de ressignificar a vida através da autonomia. (Marcella Martins)

Heidegger e o ser-para-a-morte

Segundo Heidegger, o ser humano é ser como possibilidade, como projeto, essa ideia nos induz na temporalidade. Isso não significa apenas que temos um passado e um futuro, mas que o futuro se revela como aquilo para o qual a existência é projetada e que o passado é aquilo que a existência transcende. O existir humano consiste no lançar-se contínuo às possibilidades, entre as quais se encontra a situação-limite representada pela morte. A presença se mostra como ser aberto às possibilidades, e como situação limite se depara com a morte, aquela possibilidade que dá fim a todas as outras.
A angústia é o fenômeno privilegiado, gerado pela situação limite da morte, e conduz o Dasein (presença) do impessoal para a possibilidade de ser ele mesmo. “A angústia manifesta no Dasein o ser para o poder ser mais próprio, isto é, o ser-livre para a liberdade do se-escolher-e-se-apropriar-de-si-mesmo” (HEIDEGGER citado por DUBOIS). Nesse sentido, a angústia faz do Dasein um ser de possibilidades; a partir dela ele se vê livre para escolher-se. Enquanto ser-no-mundo o Dasein é “(…) aquele que constrói, é aquele que se projeta, é poder-ser, é deixar-ser; é liberdade enquanto possibilidade” (VALE, 2008, p. 25). “Para Heidegger é indiscutível que o dasein autêntico necessita estar angustiado” (MALLMANN, 2008, p. 62).


segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Eterno retorno

Eterno retorno Ewige Wiederkunft é um conceito filosófico formulado por Friedrich Nietzsche. Podemos observar nas palavras do filósofo em A Gaia Ciência

"E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: "Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência - e do mesmo modo esta aranha e este luar entre as árvores, e do mesmo modo este instante e eu próprio. A eterna ampulheta da existência será sempre virada outra vez, e tu com ela, poeirinha da poeira!". Não te lançarias ao chão e rangerias os dentes e amaldiçoarias o demônio que te falasses assim? Ou viveste alguma vez um instante descomunal, em que lhe responderias: "Tu és um deus e nunca ouvi nada mais divino!" Se esse pensamento adquirisse poder sobre ti, assim como tu és, ele te transformaria e talvez te triturasse: a pergunta diante de tudo e de cada coisa: "Quero isto ainda uma vez e inúmeras vezes?" pesaria como o mais pesado dos pesos sobre o teu agir! Ou, então, como terias de ficar de bem contigo e mesmo com a vida, para não desejar nada mais do que essa última, eterna confirmação e chancela?"





“O inferno são os outros”.

"Tudo o que vale para mim vale para o outro. Enquanto tento livrar-me do domínio do outro, o outro tenta livrar-se do meu; enquanto procuro subjugar o outro, o outro procura me subjugar. Não se trata aqui, de modo algum, de relações unilaterais com um objeto-Em-si, mas sim de relações recíprocas e moventes. As descrições que se seguem devem ser encaradas, portanto, pela perspectiva do conflito. O conflito é o sentido originário do ser-Para-outro. Sou possuído pelo outro; o olhar do outro modela meu corpo em sua nudez, causa seu nascer, o esculpe, o produz como é, o vê como jamais o verei. O outro detém um segredo: o segredo do que sou. Faz-me ser e, por isso mesmo, possui- me, e esta possessão nada mais é que a consciência de meu possuir. E eu, no reconhecimento de minha objetividade, tenho a experiência de que ele detém esta consciência. A título de consciência, o outro é para mim aquele que roubou meu ser e, ao mesmo tempo, aquele que faz com que “haja” um ser, que é o meu." 


(SARTRE, 1999, p. 454-455).